Muito antes do low carb e gluten free, Sonia Hirsch já defendia uma alimentação consciente, sem radicalismo, distante das dietas da moda e dos alimentos ultra processados. Precursora nesta abordagem que só se populariza, a escritora e jornalista de 71 anos estuda o tema há mais de 30 anos e nos seus 21 livros publicados já abordou pautas como o câncer, os perigos do açúcar, as alergias e alimentação de crianças.
Antes de embarcar para Floripa, onde ministra o curso Meditando na Cozinha, nos dias 8, 9 e 10 de maio (mais infos sobre o curso aqui), Sonia respondeu algumas perguntas sobre o tema.
Você estuda e escreve sobre alimentação há mais de 30 anos. Neste tempo, observa que houve alguma evolução na maneira como nos alimentamos?
Houve evolução para melhor especialmente na produção de alimentos orgânicos e com os restaurantes a quilo, que permitem a quem come fora diariamente montar um prato mais saudável. Mas também houve uma evolução para pior, com mais porcaritos nas prateleiras, mais laticínios gostosos e de péssima qualidade, mais congelados, mais fórmulas que se dizem maravilhosas e não são. Aumentou a confusão entre comida de verdade e comida de mentira, porque esta muitas vezes se fantasia de integral e natural, quando de fato é muito processada.
Você costuma afirmar que as pessoas devem se auto-responsabilizar pela sua saúde física e psicológica. De que forma podemos garantir essa autonomia?
Acho que isso depende muito do autoconhecimento, da disposição que a pessoa tenha de ser honesta consigo mesma, de não se sabotar. Bons profissionais de saúde e terapeutas podem ajudar muito nisso. A homeopatia, por exemplo, ajuda a pessoa a se observar melhor. A psicoterapia estimula a refletir melhor sobre o que se passa na mente e nas emoções. Tudo pode convergir para mais autonomia em saúde se a pessoa entender que em vez de correr para a farmácia quando tem uma dor de cabeça ela pode pensar no que comeu ontem, se o intestino funcionou, se bebeu água suficiente, se seria o caso de tomar um chazinho ou simplesmente de descansar um pouco. Autonomia em saúde não quer dizer dispensar os profissionais, mas recorrer a eles somente quando não puder fazer nada a respeito de uma perturbação insistente. Muitos pequenos distúrbios podem ser resolvidos com bom senso e um pouco de conhecimento. Quanta gente passa mal simplesmente por comer demais?
Como você resumiria a receita de uma boa alimentação?
Depende muito da pessoa, mas uma boa alimentação se apoia num tripé – autoconhecimento, quantidade e qualidade. De modo geral, o que funciona é comer de tudo um pouco, com calma, mastigando bem. Incluir sempre folhas verdes, se possível levemente cozidas ou refogadas, para assimilar melhor – elas são o verdadeiro seguro de saúde. Enfatizar os vegetais, com pequenas porções de carnes, se for o caso. Evitar açúcar e tudo o que for feito com ele. Preferir comida de verdade, essa que se compra na feira e se cozinha em casa. Nunca comer demais. Hidratar-se uns 15 minutos antes de comer, para não beber durante as refeições.
Quais são os principais erros que as pessoa cometem ao escolherem dietas ditas saudáveis?
Não acho errado a pessoa experimentar. Se não for bom pra ela, basta mudar de novo. Como é possível conhecer algo novo sem arriscar um pouco? Ruim é persistir no erro!
O que de pior as crianças consomem hoje?
Muito açúcar, muita coisa feita com farinha, muito laticínio de má qualidade, muita coisa gelada.
O curso que você vai dar aqui em Floripa se chama Meditando na Cozinha. De que maneira a alimentação afetada a nossa espiritualidade?
Uma alimentação descuidada produz desconfortos físicos que afetam a capacidade de concentração, de foco. Como alguém totalmente perturbado por arrotos, gases, ansiedade e dor de barriga consegue pensar direito? Geralmente quem se empenha em meditar está procurando equilíbrio físico, mental, emocional, e melhorar a alimentação faz parte. Meditação e cachorro-quente não combinam. Quando a consciência se desenvolve, a pessoa se afasta das comidas de má qualidade porque elas simplesmente não têm energia. Comida boa tem. Isso se torna visível à medida que a consciência aumenta, e a meditação, que é um trabalho físico e mental, ajuda muito nisso.
Você escreveu “Sem Açúcar, Com Afeto” há mais 30 anos e hoje a pauta dos malefícios do doce segue em alta. Porque deveríamos diminuir o consumo de açúcar e porque é tão difícil?
Porque ele vicia e faz mal, rouba vitaminas e minerais, enfraquece o corpo e o espírito, quebra a força de vontade. É difícil diminuir o consumo porque o sabor doce proporciona uma sensação real de prazer, ainda que custe muito caro depois. Para livrar-se dele, primeiro é preciso reconhecer o vício, como se faz com qualquer outra substância viciante – por mais que a mídia bombardeie a gente a toda hora dizendo que isto é gostoso, aquilo é irresistível, tal coisa é deliciosa e dá um prazer imenso…
Mas existe aí uma questão maior que interfere muito. São os parasitas – vermes, protozoários e fungos, que se alimentam de açúcar, e que a medicina não procura mais. Muitas vezes a pessoa não dá conta de sua compulsão porque carrega consigo um monte de viciadinhos querendo mais, sempre mais.
Em tempos de informação ilimitada, ficou fácil ter acesso a muita coisa na Internet. Artigos, dietas, informações sobre filosofias com a ayurveda, macrobiótica, veganismo, etc. Como navegar nesse mar e reconhecer o que é bom pra gente?
Procurando adquirir uma boa formação. Ler livros, estudar outras línguas, ouvir pessoas de notório saber – e afastar-se da mediocridade. A internet pode ser incrível se a pessoa não ficar tentada pelo caminho mais fácil.