A Cara da Ilha: inspirado pelo projeto Humans of NY, fotógrafo de Floripa registra a beleza das histórias comuns

Registrar a beleza das história comuns. O projeto Humans of New York, do fotógrafo e historiador americano Brandon Stanton, deu tão certo (já são mais de 7 milhões de seguidores no Instagram) que inspirou iniciativas similares aos redor do mundo. Por aqui,  o fotógrafo Nando Blum lançou sua versão, nomeada A Cara da Ilha (@acaradailha), no inicio de agosto.

– A ideia é que seja um espaço sem rótulos ou estereótipos,  democrático e aberto a todos que de alguma forma se envolvem na dinâmica da cidade. gostaria que ele um dia representasse um acervo do que Florianópolis é hoje  – compartilha Nando.

Na empreitada, Nando circula por diferentes regiões de Floripa, captando registros e também relatos pessoais, a exemplo do que Brandon faz na versão gringa.

– Aos poucos as pessoas vão se abrindo comigo e relatam histórias emocionantes que viveram aqui na Ilha. Toda a conversa é gravada e transcrita para depois ser postada, com autorização. Na busca por pessoas, procuro caminhar em diferentes horários pelas regiões da ilha. E também escolhi não identifica-las pelo nome. O foco é na foto e na história.

Colocando luz sobre a beleza do comum, do dia a dia e do que nos une (há muita identificação com os sentimentos dos relatos apresentados), o projeto também faz uma provocação de cunho social:

– O primeiro passo para nos respeitarmos é nos conhecermos – finaliza Nando.

Confira algumas fotos e histórias captadas pelo @acaradailha.

Nando Blum, divulgação

Esse é meu único filho. Ele tem 5 anos. Ainda não fala.”

 

Nando Blum, divulgação

“Moramos há 10 anos aqui e meu momento de maior preocupação foi quando me deu depressão, quando eu tive a síndrome do pânico. Hoje eu consegui passar por cima. Meu conselho pra quem passa por isso é nunca desistir e procurar um tratamento de acompanhamento médico e psicológico, não é fácil e demora. A verdade é que todos já sentimos isso, mas não sabemos exatamente o que é. Antes de viver a síndrome do pânico, eu já sentia alguma coisa parecida, mas nunca tinha sido tão forte. Quando eu ficava nervosa arrepiava tudo… e eu não sabia o que era. Depois tive uma crise mais forte e consegui identificar.”

 

Nando Blum, divulgação

Nós temos uma associação de dominó de 126 anos de existência aqui no centro. Uma vez nós fomos jogar lá em Santo Amaro, valendo um boi. Chegamos lá e os camaradas só falavam em alemão e eu como não entendo nada fui vendo como era a colocação das pedras deles. Dai no final ficou um quadradinho e eu peguei e fechei o quadrado e pronto, então ninguém joga mais. Fiz isso só pra eles saberem que nós estávamos entendendo o jogo deles. Simplesmente só pra se ligar que não tem malandragem, é jogo jogado e deu.

 

Nando Blum, divulgação

Sem dúvida sair de bicicleta é a melhor parte do meu dia. Sou fissurada, desde pequena. Uma vez eu tava andando no canto da lagoa e um carro tirou um fino de mim. Eu vi que ele parou mais na frente e decidi ir lá falar com ele, numa boa. Não satisfeito, ele teve a coragem de falar que eu não devia estar andando de bike ali e que já tava de saco cheio de ciclista. Dai eu não me aguentei, fotografei a placa dele e fui na polícia registrar um BO. Conversando com o delegado ele me explicou que é muito importante fazer ocorrência deste tipo de caso porque pode ser considerado um tentativa de homicídio culposo, então é essencial registrar para a estatística anual. Quanto mais alta, mais atenção o poder público vai dar pros ciclistas.”

 

Nando Blum, divulgação

“Tenho 20 anos, sou manezinho e a maior dificuldade que eu sinto aqui na ilha eu acho que é a aceitação em relação a minha sexualidade. Antigamente era muito pior, mas aqui ainda tem uma mente muito conservadora. Mas acho que isso tá melhorando muito com o passar dos anos e também é algo que a gente vai superando. Uma vez eu tava andando aqui na Beira-Mar e um cara abriu a janela e gritou “vou te dar uma surra de p#%. Então a gente acaba às vezes se privando e meio que diminuindo o que a gente é, pra agradar as pessoas. Mas teve um certo momento na minha vida que eu pensei, não, eu vou ser quem eu sou, eu tenho que ser quem eu sou. Seja na minha sexualidade, na minha expressão, e não importa o que os outros pensam. Claro que o medo sempre vai existir, mas a gente não pode desistir de quem a gente é de verdade. A nossa missão é desconstruir essas cabeças fechadas, um dia com certeza a gente vai chegar num ponto onde todo mundo vai ser respeitar e se amar.”

 

Nando Blum, divulgação

“Eu tenho um filho que vai fazer 10 anos e com 17 dias ele foi internado no hospital infantil, entre a vida e a morte. Ele ficou 21 dias lá e eles não sabiam o que ele tinha. Sempre que eu trocava a fralda dele ele tinha uma crise de choro muito forte, e isso me deixou angustiada. Dai eu benzi ele e ele deu uma melhoradinha, mas ainda chorava e eu fiquei muito preocupada. Quando eu levei ele no hospital que fizeram um exame de sangue viram que ele tava com uma infecção. Mas graças a deus deu tudo certo né. Pra mim essa foi a maior superação da minha vida, era dia após dia. É complicado né, filho é filho.”

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Laura Coutinho

Escrito por Laura Coutinho

Laura Coutinho é jornalista com mestrado em Relações Internacionais. Já morou em Porto Alegre, Londres e Lisboa e é apaixonada por viagens, gastronomia, cultura e inovação. Trabalhou mais de 15 anos no Grupo RBS como repórter, editora, colunista e assinou coluna social durante um ano no Jornal Notícias do Dia. Hoje, concilia a produção de conteúdo em site próprio com o trabalho de relações públicas.

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